segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Baile das máscaras

Foi convidado para um baile de máscaras. Nunca havia ido e, pra falar a verdade, achava algo um tanto ultrapassado pra alguém do século XXI. Mas como o convite fora feito pela bela moça da repartição ao lado, tornou-se, logo, irrecusável.
Entrou em sites para encontrar máscaras diferentes, queria impressionar. Acabou achando em uma loja virtual de sadomasoquismo.. "ninguém vai saber a origem disso.."
Sua máscara era preta e dourada com detalhes em fios negros e metais.

Chegado o dia de estrear a máscara. Sado, tosca, jogaria fora assim que o baile acabasse.. pensou assim.
O endereço era uma antiga rua da cidade onde mansões com janelas fora de moda e portões enormes cercavam as verdadeiras prisões particulares dos novos ricos que achavam o máximo morar ali e manter tradições caretas.
Encontrou o número ostentado no muro de maria-sem-vergonha e parou o carro. Identificou-se, entrada liberada.

Pensava na bela moça da outra repartição.. o que os dividiam era aquela baia insuportável de onde pessoas cheias de problemas e manias infiltravam seus olhos nos computadores em tempo integral. A maioria já estava careca, se não obesos.
Obesos, carecas e descontentes. Era fácil distinguir a beleza naquele inferno empresarial. Era aquela moça que inundava os olhos e, diga-se de passagem, único desvio para os pares por detrás dos óculos quadrados em armação clássica.

Perto da porta que se aproximava um daqueles caras brutos, provavelmente polícia fazendo bico de segurança.. Ultrapassou e encontrou o oposto do que imaginava em sua mente enquadrada pela repartição.
A luz era baixa, quando não vermelha em alguns pontos.. as vozes misturavam risos de mulher, cheiros dos mais variados, ora de charutos de chocolate, ora de um perfume ligeiramente doce.. foi aprofundando-se na grande sala que seguia através do som de lounge com jazz.. coisa fina.

Se não fosse pra morrer naquela hora, não morreria mais. Pensou.
Ao se deparar com pessoas usando máscaras... tão somente máscaras... se achou totalmente fora do contexto com seu Armani bem passado e sapatos lustrados.
Logo virou-se, pensou secretamente ter errado de festa apesar das conferências na recepção.. quando foi agarrado suavemente no braço esquerdo e escutou uma voz em seu ouvido. A voz que conhecia bem..

"Aonde você pensa que vai?"
Congelou-se por inteiro, nem sabia se o coração estava batendo. Talvez não por alguns segundos ou horas.. incalculável. Olhou um pouco abaixo e percebeu a tatuagem fina e delicada no pulso da mulher.. era a bela da repartição ao lado.
A não ser pelo fato de que não teve tempo de olhar para a máscara antes de fitar os seios decorados com pequenos brilhantes em forma circular. Estava como todos os outros. Nua.

Ela ria dele, que queria ir mas não conseguia se mover. Há quanto tempo não via um par de seios assim, tão próximos.. e tão mais bonitos do que os dos sites que costumava visitar..
"Vamos, você tem que ficar mais à vontade!"
O puxou para próximo do bar. Pôde ver mais do que seios, pode ver contatos discretos, cantos que gemiam próximos à escuridão, risos que satisfaziam-se mutuamente..
Na primeira dose de uísque, que não bebia há tempos, pode reparar com maior facilidade nos detalhes e nas curvas que habitavam o local. A bela moça que o acompanhava percebia e deliciava-se com a situação, apoiando-se sempre nele.

Baile das máscaras... que belo evento, pensou..
Aos poucos foi percebendo os motivos do evento e o mais interessante é que a moça da repartição parecia esperar por ele, já que não saía de perto e parecia não conhecer muitas pessoas.
A conversa foi se abrindo e o fato de estar com uma máscara o fazia sentir-se forte, inabalável.
Foram umas quatro ou cinco doses até admitir que as intenções dela poderiam ser muito mais do que segundas ou terceiras..

De mãos dadas, as dele já não suavam mais, caminharam por entre os casais, os solitários e os grupos. Ouviram as falas, os risos, os ritos.. Sofás confortáveis como mandava o figurino.
Encontraram um canto apropriado, mas não necessariamente só. Percebeu que sua escolha era insignificante para ela, que queria muito mais... E logo viu que não só ela queria muito mais.
Rompia as barreiras dos mitos que guardava nas revistas e nos vídeos baixados da internet.. sentia o verdadeiro calor que era contraposto com o gelado das algemas que se soltavam.
Amarras não haviam, mulheres sim. Mas quem eram? Não importava, as máscaras fariam com que nem ele mesmo se identificasse.. e assim a noite fluiu como nunca antes imaginava.. Ele não era o cara da repartição.

Na segunda-feira era um outro homem. Talvez mais confiante, talvez mais real..
Chegou ao trabalho não mais com o seu Armani alinhado milimetricamente, cabelo levemente bagunçado.. passeava pelas repartições observando sobre-pesos e praças, aficionados em suas telas finas e coloridas.. seus olhos pararam sobre a moça da repartição ao lado, que digitava comportadamente em sua mesa.

Ela o olhou, piscou de um olho só. Voltou a digitar.
Ele sentou-se, fingiu trabalhar.