quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Samba pra rua



Eu quis ver você passar
Fui pra perto da rua
Teu carnaval era tão solto
Que logo me encantei

Nas ruas todos falam dela
Os bordados, as fitas, os dons
Não precisa luz de passarela
Sampa cinza e tijolo marrom

Ela sabe que eu quero
Fica difícil, assim, disfarçar
Janela, flanela, festa de rua
Sorriso e samba no tom, no tom...

Percorro pra perto do mar
Areia dissolve em centenas de grãos
Faço abraço de braços e mãos
Sugiro, te peço, te sinto ou não


domingo, 19 de agosto de 2012

Personagem

Por certo, seu gosto refinado fazia com que aromas dos mais porcos tornassem perfume dos mais suaves quando bem entendia. Uma estranha obsessão por ler as coisas de trás pra frente e por números múltiplos de nove o mantinham na linha da calma durante tempo integral.

Fazia-se entender em público perfeitamente, quando expressava-se de forma adequada às normas da sociedade. Aliás, seu discurso era impecável como o de um candidato a presidência. Talvez pelo fato de dizer coisas ordenadamente, porém, não necessariamente fazendo sentido algum. Convencia.

Atraíam-no loiras, às vezes morenas. Menos as ruivas e tentava fazer-se entender o motivo dessa complicação ao chegar no prostíbulo mais próximo. Vez ou outra a lembrança em imagem de uma batina com melenas ruivas se apossava de seus pensamentos. O toque enjoativo daquele padre em seu corpo frágil e nu, seu corpo de criança.. Talvez as informações cruzassem neste ponto. Ainda assim, mantinha-se hétero. Mas não frequentava a igreja desde que atingira a maioridade.

Seus costumes eram preferencialmente escuros, revezando entre tons de cinza, preto e marrom. Hábitos noturnos. Digestão lenta e imprecisa. Frequentemente encontrava-se com dores abdominais, fruto de um recorte mais preciso de seu talento para a cozinha. Especialmente comidas cheias de gordura e cremes.

No seu dia-a-dia fazia de seus horários de trabalho, um meio fácil e divertido de ganhar um dinheiro derivado de figuras públicas. Figuras escrotas.

Trabalhava nos bastidores de um esquema simples e corrompido. Pessoas ligavam-se obrigatoriamente a ele, vez ou outra, por ser parte essencial em uma equipe de chantagistas profissionais. Mas preferia trabalhar sozinho, assim como divertia-se nas horas vagas.

Quando menos se espera, você cruza com ele em um corredor movimentado do shopping, mais precisamente em frente a vitrine de batedeiras elétricas, mesmo sem saber que colecionava diversos modelos e cores destas peças. Lembrava sua mãe, confeiteira de primeira mão.

Quando calado, cidadão comum. Quando falante, persuasivo em seus versos e referências poéticas, muitas das quais inventava as frases e autores. Mas você não ousaria duvidar de sua precisão com as entonações de voz que oscilavam milimetricamente por entre a língua e dentes amarelados pelo fumo de charutos.

E pode, ainda, encontrá-lo.
Se tiver a sorte de não ser por motivos profissionais, deleite-se com um discurso redundante e seus gestos desengonçados. Ria por dentro, mas não ouse demonstrar seu riso por fora. Ele cozinha bem.. e nunca se soube a procedência exata da carne do seu estrogonofe.

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Mudança de postura

Apesar de meu antigo gosto pela luta e direito do voto, direito de ir e vir e essas coisas que a gente se sente bem ao compartilhar nas redes sociais mas que nada faz valer na vida REAL, me sinto livre hoje.
Vou lhes contar porque.

Andei conversando com pessoas que têm, no mínimo, o dobro da minha idade, e constatei uma situação política similar desde os tempos passados. O que eu quero dizer com isso?
Que não importa quem você coloque no poder, quem comande o país ou tentar usar o "voto consciente". O Brasil vai continuar sendo dominado pelos poucos que chegaram no poder absoluto na ditadura disfarçada, diga-se Sarney, Dirceu, Lula..

Você compartilha uma mensagem anti-corrupção nas mídias sociais (assim como eu mesmo já compartilhei algumas) e sente-se mais aliviado por alguns cliques. Digo a você algo que decepciona: seus cliques e compartilhamentos, assim como os meus, não adiantam NADA.

O bairro onde eu moro está um LIXO com tantas placas de novas caras, novos números e novas promessas pra essa eleição. Sem contar os trios elétricos, luzes e adesivos que enfiam na nossa cara quando menos se espera.

Esse sistema político está diretamente relacionado com o PODER. Basta colocar o poder na mão de um revolucionário qualquer, dar dinheiro, benefícios, mulher gostosa, carro e um sítio. O que ele vai virar? Mais um lunático sócio do Brasil.

Sem generalizações, tem políticos sérios... Sério.

Mas o grande sistema político que COMANDA o rumo do país NÃO MUDARÁ, independente do seu voto, dos seus cliques ou das suas passeatas. Não temos acesso ao que realmente implicaria em uma mudança realista das coisas. E nunca teremos.

Eleja o presidente X, Y, Z... e mensalões continuarão acontecendo. Mensalão, aliás, está em um julgamento fora da realidade e posso garantir que não dará em nada. Bons advogados, bons contatos, grandes atuações circenses para o nosso povo assistir feliz à novela da emissora endeusada por nós mesmos.

Não quero discursar como um político pra falar justamente o contrário.
Então fico por aqui... Se você leu, obrigado.

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Gula

A brecha, o forro, a fenda
Esperam pela chegada da brasa, do couro
que completa, que inunda e se porta intrigante
O mito, a cultura, o sexo

Cura...

A chance, imaginação, os olhos
Comer com os olhos antes de encostar a língua
Espessa forma de separação que existe
entre o que se vê e o que se quer

Gula...

As mentes, as pintas, as marcas
Compõem um conjunto complexo, a chave
O cadeado, a porta, a fechadura
Curvas que entram e saem do campo de visão

Rosado...

O sim, o não, o talvez
Aprendem a conviver de dentro, de fora
Fora e dentro..
Continuidade óbvia, como tudo na vida
faz um movimento

Instintivo...

A peça, o encaixe, a completude
O emaranhado quebra-cabeças da imaginação
Você esconde, expõe, se mostra
Como é e como queria ser

Desejo...

O que te impede?



Questionar é seu direito

Guilhotina, os fios de sol que entram de leve pela janela contrastam com as dores da vida real. Se bem que entenderia facilmente se o sol não fosse real, de tão intenso e vívido..
O excesso de esperança que vejo nas pessoas torna-se alvo fácil para os aproveitadores de "Deus", que circulam ao nosso lado nas ruas, dizendo-se cheios de virtudes e enviados por "Ele".
Paro e penso: quem é este ser humano que tem a audácia de se julgar superior e, pior ainda, o ATREVIMENTO de dizer-se enviado dos céus? E que história é essa de céu?

Céu e inferno, bem e mal.. todas as figurações criadas para que pudéssemos, se não entender, nos consolar sobre os acontecimentos bons ou ruins que nos acontecem diariamente. Me intriga o fato do comportamento humano estar ligado ao medo de ir para um lugar ou outro depois da sua morte. Uns deixam-se levar na maré destas figurações, muitas vezes absurdas. Outros jogam a culpa nos seus deuses, seus demônios e santos depois de não "serem atendidos" por eles.

Enquanto isso, os palácios ostentam seus tamanhos, seus dourados, suas peças intocáveis de ouro e mármore. É tão difícil ser simples? Não digo ser humilde, chorar e viver na necessidade por fé em algo.
Nem passar sacrifícios para poder ir para o tão aclamado "céu". Mas ser simples no sentido de passar recados verdadeiros, ajudar na construção de uma cidadania verdadeiramente imponente à nação que chora por corrupção.

E ao invés disso, muitos dos que se dizem enviados por seu deus, fazem parte do mesmo maço sujo de cigarro barato onde estão os corruptos. Ta aí uma coisa que eu nunca entendi e não pretendo: excesso de poder. Por que será que tantos perdem a noção do limite quando tem o poder nas mãos? Como essas pessoas dormem de noite, se eu que, por muito menos, já passo a noite em claro?

Todo o maquinário das intrigas políticas e religiosas usam VOCÊ pra justificar seus atos. Ora tiram o seu dinheiro, ora tiram o seu direito de pensar da maneira mais prudente. Me entristece pais que deixam de colocar comida na mesa para entregar ao dízimo, já que ele garante sua paz com Deus. Assim como me entristece os caras lá no Senado que nos roubam descaradamente e continuamos votando, elegendo, sorrindo... Inibem o seu pensar, tiram da educação e colocam o medo divino em suas mentes. Pronto, estão com você nas mãos

Me perdoe se você não concorda. Aliás, não quero o seu perdão, quero o seu pensar. Se você leu até aqui e, espero, entendeu o recado, plantei uma semente do questionamento na sua mente. Pra mim, satisfaz.

Só haverá revolução verdadeira quando cada indivíduo entender que CONHECIMENTO pode ser auto-didata e não depender do que passa nas televisões, nos encontros religiosos...

Sou defensor do direito de questionar.

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Baile das máscaras

Foi convidado para um baile de máscaras. Nunca havia ido e, pra falar a verdade, achava algo um tanto ultrapassado pra alguém do século XXI. Mas como o convite fora feito pela bela moça da repartição ao lado, tornou-se, logo, irrecusável.
Entrou em sites para encontrar máscaras diferentes, queria impressionar. Acabou achando em uma loja virtual de sadomasoquismo.. "ninguém vai saber a origem disso.."
Sua máscara era preta e dourada com detalhes em fios negros e metais.

Chegado o dia de estrear a máscara. Sado, tosca, jogaria fora assim que o baile acabasse.. pensou assim.
O endereço era uma antiga rua da cidade onde mansões com janelas fora de moda e portões enormes cercavam as verdadeiras prisões particulares dos novos ricos que achavam o máximo morar ali e manter tradições caretas.
Encontrou o número ostentado no muro de maria-sem-vergonha e parou o carro. Identificou-se, entrada liberada.

Pensava na bela moça da outra repartição.. o que os dividiam era aquela baia insuportável de onde pessoas cheias de problemas e manias infiltravam seus olhos nos computadores em tempo integral. A maioria já estava careca, se não obesos.
Obesos, carecas e descontentes. Era fácil distinguir a beleza naquele inferno empresarial. Era aquela moça que inundava os olhos e, diga-se de passagem, único desvio para os pares por detrás dos óculos quadrados em armação clássica.

Perto da porta que se aproximava um daqueles caras brutos, provavelmente polícia fazendo bico de segurança.. Ultrapassou e encontrou o oposto do que imaginava em sua mente enquadrada pela repartição.
A luz era baixa, quando não vermelha em alguns pontos.. as vozes misturavam risos de mulher, cheiros dos mais variados, ora de charutos de chocolate, ora de um perfume ligeiramente doce.. foi aprofundando-se na grande sala que seguia através do som de lounge com jazz.. coisa fina.

Se não fosse pra morrer naquela hora, não morreria mais. Pensou.
Ao se deparar com pessoas usando máscaras... tão somente máscaras... se achou totalmente fora do contexto com seu Armani bem passado e sapatos lustrados.
Logo virou-se, pensou secretamente ter errado de festa apesar das conferências na recepção.. quando foi agarrado suavemente no braço esquerdo e escutou uma voz em seu ouvido. A voz que conhecia bem..

"Aonde você pensa que vai?"
Congelou-se por inteiro, nem sabia se o coração estava batendo. Talvez não por alguns segundos ou horas.. incalculável. Olhou um pouco abaixo e percebeu a tatuagem fina e delicada no pulso da mulher.. era a bela da repartição ao lado.
A não ser pelo fato de que não teve tempo de olhar para a máscara antes de fitar os seios decorados com pequenos brilhantes em forma circular. Estava como todos os outros. Nua.

Ela ria dele, que queria ir mas não conseguia se mover. Há quanto tempo não via um par de seios assim, tão próximos.. e tão mais bonitos do que os dos sites que costumava visitar..
"Vamos, você tem que ficar mais à vontade!"
O puxou para próximo do bar. Pôde ver mais do que seios, pode ver contatos discretos, cantos que gemiam próximos à escuridão, risos que satisfaziam-se mutuamente..
Na primeira dose de uísque, que não bebia há tempos, pode reparar com maior facilidade nos detalhes e nas curvas que habitavam o local. A bela moça que o acompanhava percebia e deliciava-se com a situação, apoiando-se sempre nele.

Baile das máscaras... que belo evento, pensou..
Aos poucos foi percebendo os motivos do evento e o mais interessante é que a moça da repartição parecia esperar por ele, já que não saía de perto e parecia não conhecer muitas pessoas.
A conversa foi se abrindo e o fato de estar com uma máscara o fazia sentir-se forte, inabalável.
Foram umas quatro ou cinco doses até admitir que as intenções dela poderiam ser muito mais do que segundas ou terceiras..

De mãos dadas, as dele já não suavam mais, caminharam por entre os casais, os solitários e os grupos. Ouviram as falas, os risos, os ritos.. Sofás confortáveis como mandava o figurino.
Encontraram um canto apropriado, mas não necessariamente só. Percebeu que sua escolha era insignificante para ela, que queria muito mais... E logo viu que não só ela queria muito mais.
Rompia as barreiras dos mitos que guardava nas revistas e nos vídeos baixados da internet.. sentia o verdadeiro calor que era contraposto com o gelado das algemas que se soltavam.
Amarras não haviam, mulheres sim. Mas quem eram? Não importava, as máscaras fariam com que nem ele mesmo se identificasse.. e assim a noite fluiu como nunca antes imaginava.. Ele não era o cara da repartição.

Na segunda-feira era um outro homem. Talvez mais confiante, talvez mais real..
Chegou ao trabalho não mais com o seu Armani alinhado milimetricamente, cabelo levemente bagunçado.. passeava pelas repartições observando sobre-pesos e praças, aficionados em suas telas finas e coloridas.. seus olhos pararam sobre a moça da repartição ao lado, que digitava comportadamente em sua mesa.

Ela o olhou, piscou de um olho só. Voltou a digitar.
Ele sentou-se, fingiu trabalhar.


quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Poema das palavras tortas

Quero trazer seu amor em 24hs
Entender porque a beleza é tão superestimada 
A inteligência ignorada, as drogas liberadas
E no fundo, ninguém viu..

Quero pintar suas unhas do jeito que eu não sei
Pra sujar seus dedos de vermelho
Que você vai passar pelo meu corpo
Demasiadamente branco pela falta do sol

Talvez queira também fazer brigadeiro de panela
E jogar pela janela, na cabeça de alguém
Mas logo me lembro que não sei fazer brigadeiro
Entro em desespero e peço pra outrem 

Quero espancar um corrupto com um taco
Depois cantarolar uma música de Jobim
Sentir a brisa batendo no rosto
Acender um cigarro de capim

Quero correr pelado
Mas tenho medo do inverno
Que reduz pela metade
Meu amigo mais fraterno

Quero não saber que a maioria é ignorante
Por uma ganância constante
De outros tantos ladrões disfarçados
Crentes no poder além da vida

Quero, acima de tudo, nada
Pra que possa descansar a mente 
Da vida perturbada