quinta-feira, 12 de abril de 2012

Um pouco só de sacanagem (parte 4)

Essa aconteceu com o amigo de um amigo meu...

Da sala para o quarto, entre a pequena sala de jantar onde festejavam formigas ao devorar os restos de pizza de calabresa, ele resolve escovar os dentes e se preparar para mais uma noite solitária de sono.
Ao levantar-se do sofá e olhar ligeiramente para o lado da sacada de seu apartamento, olha, desvia e olha novamente.
Pega o óculos na ponta do sofá, coloca-os para ajustar seu foco.
Era realmente ela... a vizinha do apartamento da frente estava desfilando de calcinha e blusinha brancas...  “Esse remédio pra dormir...” – pensou.
E foi escovar os dentes. TV ligada.

Intrigado, escovou os dentes com o pensamento na vizinha. Talvez tivesse escovado só o lado esquerdo da arcada dentária... Talvez nem tivesse colocado pasta de dentes na escova. Voltou logo à saleta de TV.
Agora, mais próximo da sacada, podia ver a vizinha com seu cabelo esvoaçante, calcinha e blusa branca, arrumando seu armário...
Era um desafio prestar atenção em qualquer que fosse o movimento ao seu redor, a não ser a vizinha. Podiam entrar em sua casa, levar tudo, até seu samba-canção listrado que vestia para dormir. Ficaria nu, mas não tiraria os olhos da vizinha.
Abaixava-se e levantava-se com uma graciosidade, uma cumplicidade que parecia saber estar sendo observada... nem mesmo por um, mas por vários voyeurs curiosos e sedentos pelos próximos movimentos... os vizinhos, os fãs.
Ele apertava os olhos, a boca salivava. O coração mantinha um ritmo frenético e impulsivo e a mente pensava em construir uma ponte que ligasse suas janelas.

A vizinha termina a arrumação. Despe-se da blusa e caminha ao que parecia ser o banheiro... Ele teve uma iluminação, um brilho lhe afetou todo o seu comportamento que até dez minutos atrás era de um solitário telespectador... aquela “companhia” era inimaginável, ainda mais para uma quinta-feira, mais de meia-noite.
Podia ver ali, o balançar leve de suas partes mais reclusas até então, os movimentos graciosos que caminhavam para lá e para cá, ora pegando uma toalha, ora se abaixando como se procurasse algo.
Segundo muitos, neste momento ele pecava. Caminhava lentamente entre a luxúria e a gula... sim, a gula! Gula de comer com os olhos, salivar com a boca... Sede e fome, um sentimento quase que instintivo não o deixava desgrudar os olhos da janela da vizinha.
Não havia como comprovar, mas jura que ela sabia de todo o seu interesse e olhares curiosos, excitados e perdidos. E fazia movimentos ainda mais graciosos, como que numa maré lenta que se aproxima da orla de uma ilha deserta...

O mundo podia ser ele e a vizinha. Ponto.
Despidos de qualquer moral, julgamento ou preconceitos... despidos de roupa. Esse era seu primeiro pensamento. Talvez até o único, pulando a parte da moral.
O momento que ele esperava mas não queria acreditar acontecer, precede de uma volta e a última peça de roupa que lhe servia nas sinuosas curvas é retirada vagarosamente.
Ele corresponde com o coração na garganta, apertando seu pescoço e os pulmões se contraiam rapidamente, como se houvesse corrido uma maratona.
Estava lá, despida de todo o pudor, controle ou inibição, a vizinha exibicionista.
Volta com a escova de dentes, escova com toda a propriedade que ele nem se deu ao trabalho de fazer naquela noite, por estar com a atenção voltada nela...
Num vai e vem de movimentos desconcertantes ele pensa em fotografar. Mas percebe que ninguém poderia compartilhar daquele seu momento. Sentiria ciúmes!
Percebeu que o registro fotográfico e mental era a melhor opção para o seu amor solitário de uma noite quente, na quinta. E o melhor, estava acontecendo ao vivo e a cores... vibrantes cores...

Ele explode num desencontro casual entre os desejos e imaginação que elevou às alturas toda sua fértil solidão, todo o seu desencontro real.
As luzes abaixam.. a vizinha se despede como o balançar das ondas de uma quinta-feira na orla da praia...
Ela entra no banho. Ele entra em colapso.


E foi assim que me contaram.


E fim.